domingo, 23 de janeiro de 2011

O que eu fiz por alguns e o que alguns fizeram por mim??


Não, por favor não pense que eu acho que a amizade deva ser algo recíproco, apenas que seja justo.
Num sentido bem fiel à palavra justiça no que se refere ao esforço em manter perto de você alguém que de certa forma precise de algo que você tem para dar, a isso, você chama de amizade, enquanto ela chama de aproveitar o que você tem para dar...
Um dia, ainda que você tenha, aparecerá outra pessoa com o mesmo, ou um pouco mais do que poderia dar e lá se vai a amizade...
Justo? me dirão que não, que não era amizade, apenas interesse...
Mas falo da minha parte do processo, a de ser amigo, amigo de verdade, desses que abre mão de certas coisas, que traz nos ombros uma almofada macia para aquela amigo unilateral... onde só um lado é amigo, o outro um pacote de interesse dos mais diversos possíveis.
Uma amiga minha me disse hoje que passou diversas amizades na peneira, sobrou apenas uma. Um bom número se levando em conta que ela deveria ter mais de mil pessoas que consideravam amigas.
Eu tenho medo de que essa peneira me deixe só.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Crasso amor! (Parte 2)

(Clique aqui e leia a primeira parte)
Sempre passei maus bocados, mas sempre sozinho, sempre entrei e saí de minhas enrascadas só. Lembro-me de quando criança ter subido na casa para retirar uma peteca e não sabia como descer, quando meu irmão trouxe a escada eu já estava no chão, como tinha feito isso não me recordo.
Acho que a única enrascada que me meti juntamente com outra pessoa foi quando me casei, porém ainda acho que isso foi uma atitude que tomei também sozinho, já que minha ex-esposa, parece se divertir com o fato.
No mês de junho a cidade se enchia para as festas de São João, os primos e as belas primas de Salvador chegavam trazendo novidades, roupas bonitas e sempre um amigo ou uma amiga para conhecerem a cidade. Era uma verdadeira festa.
Ana Maria era a minha preferida, de olhos negros e longos cabelos tão negros quanto, sempre me trazia uma lembrança, certa vez me trouxe um walk-man e uma fita do Jim Diamond, que me fez pensar nela por todo ano seguinte.
Meu pai, devoto de São João, tinha até o nome do Santo, que fazia questão de dizer: “João, igual ao Santo...”. Por isso ele mesmo ornamentava a rua e ajudava na decoração da cidade com doação de gordas quantias em dinheiro.
Certa época fez questão de ele mesmo trazer o Rei do Baião para a cidade.
Lembro-me que quando o carro parou na frente de casa meu pai que não dormia a alguns dias quase desmaia, e feito um louco saiu se chocando com os móveis e gritando: “o Rei chegou... o Rei chegou...”
O velho Luiz desceu do carro amparado em uma bengala, pois na época já sofria com os primeiros sintomas da doença que o levou para o túmulo.
Meu pai não sabia o que fazer, era tão visível seu nervosismo que o velho Lula, sorria um riso gostoso que balançava as bochechas de forma gostosa de se ver.
Dormiu no quarto de hóspedes, por isso meus primos dividiram o quarto com todos, foi nessa época meu primeiro beijo, ao som de Luiz Gonzaga, que no quintal de casa, sob um frondoso pé de manga e a Triste Partida, cantada a pedido de meu pai que sempre chorava e balançava a cabeça confirmando que a dor do retirante era a dele, como de fato tinha sido, mas ele, pelo menos tinha voltado, estava em casa, com a família, uma família grande, unida, feliz e ainda por cima hospedando em sua casa, comendo do seu feijão o velho Lula, coisa que ele fazia questão de contar quantas vezes desse vontade, o que quase era sempre...
Mas aquele ano não seria só de alegria como foram os festejos juninos, foi exatamente nesse ano que mamãe morreu, vitima de uma doença que nunca soube na verdade o que era e a partir daí meu pai começou a beber, sair a noite e passar dias fora de casa, aos poucos perdera o prazer pela vida, pelas coisas que gostava. Eu na minha adolescência sentia que o perderia a qualquer momento, paramos de nos falar, todos em casa paramos de nos falar, meus irmãos começaram a crescer muito rápido, o Rodrigo foi morar com uns parentes em São Paulo e nunca deu notícias. Amaris casou com um fazendeiro de Minas e teve uma filha com síndrome de Down, e dedicou toda a sua vida para cuidar dela.
Certa noite coloquei um LP de Luiz Gonzaga na vitrola e fiquei esperando meu Pai chegar. Peguei no sono e quando acordei o vi chorando ao meu lado ouvindo de novo a Triste Partida. Nesse momento eu percebera que ele era o verdadeiro personagem daquela música, tinha abandonado tudo e não tinha mais como voltar, suas mãos finas, seus ralos cabelos e o cheiro forte de bebida pareciam tomar conta de toda a sala, a sala onde tinham acontecido grandes festas, onde eu tinha visto momentos de alegria, estava agora tão deserto como nosso vida.
Queria lhe dizer alguma coisa, afagar seus cabelos ralos e brancos, lhe abraçar, mas eu não o fiz, fingi estar dormindo, enquanto ele soluçava, enquanto seu suor exalava o cheiro das putas com quem dormia, o cheiro do cigarro e da bebida, queria dizer o quanto o amava,  o quanto ele ainda era um gigante para mim, um exemplo, um herói, queria lhe dar o poema que tinha feito onde dizia que ele era uma estrela, uma coisa do espaço sideral, não desse mundinho de merda...
Foi a ultima vez que o vi.
(Continua...)