Havia tanta fúria em seu coração que isso parecia lhe guiar por entre a sala e os corredores cheio de quadros falsos, fosse em outra oportunidade teria parado e admirado cada um deles, mas agora não, um tipo de instinto o guiara até ali, a rua, o portão, o jardim mau cuidado e a porta aberta, seu carro na garagem, com a chupeta de Betinho pendurada no retrovisor e a marca de arranhão do lado direito, havia encostado no carro do chefe e ainda não tinha tido coragem de dizer nada.
Ante a porta de um quarto parou, tentou encontrar ar, respirou lentamente para não fazer barulho, ouviu a voz rouca de Mári dizendo algo que não decifrou, um pouco de silencio e gemido ofegante de Rodrigo se fez ecoar pelo corredor.
Conferiu pela milésima vez que a arma estava presa ao cinto na parte de trás.
Segurou a maçaneta e a girou lentamente, a porta se abriu sem ruído algum, ajoelhada aos pés da cama Mári se concentrava em satisfazer oralmente o dono da casa.
Suas pernas tremiam.
Sua presença foi logo notada pelo casal que em vão tentara se recompor.
- Vá embora, saia de minha casa, seu corno! A voz ríspida do homem enchia de fúria e intimidação!
- Vim buscar minha mulher – gaguejou Marinho olhando para os seis à mostra de sua esposa.
- Só vou depois que terminar – um riso irônico escapou pelo lado esquerdo de seu lábio – agora vá embora que ta na hora de pegar Marta na escola...
Marinho baixou a cabeça, queria dizer alguma coisa, sabia das traições da esposa, sabia que não poderia fazer nada, não era a primeira vez que vira ela com Rodrigo e eles sempre debochavam dele.
Queria ter coragem de puxar o gatilho, de acabar com aquilo de uma vez por todas.
Havia tanta dor dentro de si que ficou paralisado...
- Toma a chave do carro e espera, vou já... – disse ela demonstrando um pouco de compaixão.
- Mas e Marta ? – falou sem perceber
- Ainda faltam 30 minutos... – foi a resposta.
Marinho saiu do quarto sem mais palavras.
Entrou no carro e as lágrimas tomaram conta de si...
A arma o incomodou ao sentar, lembrou-se que tinha pegado emprestado com seu primo, que é policial sob a recomendação de não fazer besteiras.
A posição favorita de Mári foi interrompida com o barulho do tiro que vinha da garagem.
- O idiota se matou! – gritou Rodrigo pulando da cama sem se importar se derrubaria a amante de cima de si.
Se depararam com Marinho, arma ainda fumegando em punho e com expressão de pavor nos olhos:
- Disparou, desculpa.